
O Brasil tinha quase tudo para ser um país desenvolvido e na liderança de desenvolvimento de todo o Hemisfério Sul, e até tem um histórico de rebeliões, mobilizações e esboços de revoluções libertárias vindas de todas as classes sociais ao longo dos séculos. Apesar disso, esse histórico parece ter descontinuado depois do gradual enfraquecimento dos valores de coesão social por conseqüência da consolidação da mídia como um oficioso “quarto poder” nessas cerca de duas décadas de Nova República democrática. Essa nova “autoridade” terminou trazendo um controle cultural e psicológico para o povo que vivia e vive carregado de motivos para se rebelar contra as muriçocas que todos os dias o picam e o deixam doente. É esse controle que tira do povo, como numa anestesia, o incômodo dessas “muriçocas”, mesmo elas permanecendo ativas e agressivas.
Essa não-reação às picadas é o que pode ser percebido como a alienação, ou pelo menos a versão mais crítica dela. Eis uns exemplos estrangeiros.
A Argentina ainda não é “primeiro mundo”, mas, ao menor sinal de aumento da violência ou de ameaça de crise financeira nacional, como aconteceu anos atrás, massas populares vão às ruas, e com seu patriotismo e civismo fazem história, fazem notícias que ecoam nos jornais do mundo inteiro, vide os panelaços contra a crise econômica e os protestos contra a violência na capital Buenos Aires.
Não é aquele civismo tolo de apenas cantar hino, venerar a bandeira e torcer para a seleção nacional de futebol, mas sim o civismo prático, o sentimento patriota que impele a protestar, manifestar-se, fazer valer os direitos dos cidadãos e a integridade de seu país. Em 2001, os argentinos derrubaram dois presidentes em pouco tempo e, com muito suor, se livrariam de medidas opressoras como o “corralito”, a limitação das movimentações financeiras populares. O governo seguinte, para não cair também, teve que suar para ajeitar a economia e abolir a opressão financeira que sufocava as pessoas.
É vendo isso que vem a certeza de que a Argentina, por mais inveja e “freguesia” que tenha em relação ao futebol brasileiro, aplica no Brasil grandes goleadas em outro campo, o cívico-cidadão. Na França, em 2006, milhares de jovens foram às ruas e conseguiram com todo seu fervor derrubar uma proposta de lei que diminuía os direitos do primeiro emprego, manifestando insatisfação com algo que não havia sido democraticamente debatido.
E na antiga Iugoslávia, em 1999, o povo foi protestar pedindo a renúncia do ditador Slobodan Milosevic e foi vitorioso, livrando a Europa de sua última ditadura. Já no Brasil, há uma tendência velada de que em alguns anos a situação beire o realmente insuportável em âmbitos como os da segurança, saúde e transporte públicos.
Além disso, há um leque de “sufocos” não tão emergenciais, mas ainda assim em situação quase crítica, como a escalada da violência urbana, as reincidências de corrupção no Distrito Federal, a perpetuação da má distribuição de renda e a degradação ambiental. Sob o olhar de um cidadão consciente, seria mais do que hora de ir para a rua e exigir a contenção desses problemas sérios, exigir a “dedetização” contra as “muriçocas” que picam e adoecem a nação. Mas não é o que acontece. A verdade é que poucos se prestam a manifestar em público insatisfação com a situação, enquanto a grande massa continua paralisada, metade hipnotizada pelas músicas da moda, pelos campeonatos estaduais e nacionais de futebol e nas novidades “quentes” das novelas, metade ansiosa por soluções e providências mas resignada e inepta perante seu próprio poder de exigi-las.
Robson Fernando – robfernando@uol.com.br
Essa não-reação às picadas é o que pode ser percebido como a alienação, ou pelo menos a versão mais crítica dela. Eis uns exemplos estrangeiros.
A Argentina ainda não é “primeiro mundo”, mas, ao menor sinal de aumento da violência ou de ameaça de crise financeira nacional, como aconteceu anos atrás, massas populares vão às ruas, e com seu patriotismo e civismo fazem história, fazem notícias que ecoam nos jornais do mundo inteiro, vide os panelaços contra a crise econômica e os protestos contra a violência na capital Buenos Aires.
Não é aquele civismo tolo de apenas cantar hino, venerar a bandeira e torcer para a seleção nacional de futebol, mas sim o civismo prático, o sentimento patriota que impele a protestar, manifestar-se, fazer valer os direitos dos cidadãos e a integridade de seu país. Em 2001, os argentinos derrubaram dois presidentes em pouco tempo e, com muito suor, se livrariam de medidas opressoras como o “corralito”, a limitação das movimentações financeiras populares. O governo seguinte, para não cair também, teve que suar para ajeitar a economia e abolir a opressão financeira que sufocava as pessoas.
É vendo isso que vem a certeza de que a Argentina, por mais inveja e “freguesia” que tenha em relação ao futebol brasileiro, aplica no Brasil grandes goleadas em outro campo, o cívico-cidadão. Na França, em 2006, milhares de jovens foram às ruas e conseguiram com todo seu fervor derrubar uma proposta de lei que diminuía os direitos do primeiro emprego, manifestando insatisfação com algo que não havia sido democraticamente debatido.
E na antiga Iugoslávia, em 1999, o povo foi protestar pedindo a renúncia do ditador Slobodan Milosevic e foi vitorioso, livrando a Europa de sua última ditadura. Já no Brasil, há uma tendência velada de que em alguns anos a situação beire o realmente insuportável em âmbitos como os da segurança, saúde e transporte públicos.
Além disso, há um leque de “sufocos” não tão emergenciais, mas ainda assim em situação quase crítica, como a escalada da violência urbana, as reincidências de corrupção no Distrito Federal, a perpetuação da má distribuição de renda e a degradação ambiental. Sob o olhar de um cidadão consciente, seria mais do que hora de ir para a rua e exigir a contenção desses problemas sérios, exigir a “dedetização” contra as “muriçocas” que picam e adoecem a nação. Mas não é o que acontece. A verdade é que poucos se prestam a manifestar em público insatisfação com a situação, enquanto a grande massa continua paralisada, metade hipnotizada pelas músicas da moda, pelos campeonatos estaduais e nacionais de futebol e nas novidades “quentes” das novelas, metade ansiosa por soluções e providências mas resignada e inepta perante seu próprio poder de exigi-las.
Robson Fernando – robfernando@uol.com.br
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